13 de junho de 2004

Reagan, fato e fantasia

Greg Palast diz que condenação, não louvor, é o que o ex-presidente merece

Greg Palast


Tradução / Sei que vocês não vão gostar do que segue. Não se deveria falar mal dos mortos. Mas nesse caso, alguém precisa fazê-lo.

Ronald Reagan era um vigarista. Reagan era um covarde. Reagan era um assassino.

Em 1987, acabei me encontrando num miserável vilarejo da Nicarágua, chamado Chaguitillo. Apesar de famintas, as pessoas eram bastante bondosas, com exceção de um jovem mal-humorado. Sua esposa tinha acabado de morrer de tuberculose.

Ninguém morre de tuberculose se tiver acesso a antibióticos. Mas Ronald Reagan, homem de grande coração que era, tinha imposto um embargo ferrenho com relação aos remédios destinados à Nicarágua, porque ele não gostava do governo que tinha sido eleito pelo povo.

Ronnie ria e contava piadas enquanto os pulmões da jovem mulher se enchiam até ela parar de respirar. Reagan cintilava aquele seu sorriso de filme de terceira categoria, enquanto a mãe de três crianças estava sendo enterrada.

E quando os terroristas do Hezbollah atacaram e assassinaram centenas de marines americanos que estavam dormindo, o guerreiro de TV fugiu como cachorro com medo de chicote... e depois fez meia-volta volver e invadiu Granada. Aquela pequena guerra de Club Med foi um golpe assassino de Relações Públicas de modo que Ronnie pudesse organizar paradas em celebração ao assassinato dos cubanos que estavam construindo um aeroporto.

Lembro-me de Nancy, caveira e tíbias cruzadas empinada em vestidos de designers, algumas das "dádivas" que fluíam para os Reagans – de chapéus a casas de milhões de dólares – presentes de camaradas bem compensados pelo saque de governo. Antigamente se chamava isso de suborno ou corrupção.

E enquanto isso, o Vovô sorria, o vovô que alardeava sobre "valores de família", mas nunca se incomodava de ver seus próprios netos.

O The New York Times de hoje, em seu obituário enlatado, escreveu que Reagan projetou "fé na América simples do interior", "valores de antigamente". "Valores" o cacete. Foi é a demolição dos sindicatos e uma declaração de guerra aos pobres e a quem quer que não pudesse comprar roupas de designers. Foi é a Nova Vileza, trazendo de volta a fome para a América, só para que cada milionário pudesse ganhar outro milhão.

Valores "simples do interior"? De parte da estrela de cinema de Pacific Palisades, do magnata de Malibu? Me dá enjoo.

E enquanto isso, no sótão da Casa Branca, enquanto seu cérebro se decompunha, seu último ato consciente foi perdoar um golpe de estado contra o nosso Congresso eleito. O secretário da Defesa de Reagan, Gaspar o Fantasma Weinberger com o tresloucado Coronel, Ollie North, conspiravam para armar o Monstro do Oriente Médio, o aiatolá Khomeini.

A patota do Reagan chamava Jimmy Carter de bezerro desmamado, embora Carter nunca tivesse cedido nada ao aiatolá. Reagan, com aquele ar de durão vigarista de filme de ficção em frente da câmera, passou a implorar como uma barata covarde para que Khomeini soltasse os reféns.

Ollie North foi ao Irã com um bolo de aniversário para o mulá maníaco – não é piada não – com o formato de chave. A chave do coração do Reagan.

Daí as baratas de Reagan misturaram sua covardia com o crime: aceitando dinheiro dos sequestradores de reféns para comprar armas para os "contras" – os narco-líderes da Nicarágua que posavam de lutadores da liberdade.

Lembro-me, quando estudante em Berkeley, das palavras do megafone: "O governador do Estado da Califórnia, Ronald Reagan, pelo presente, ordena que a manifestação se disperse"... e daí chegaram o gás lacrimogêneo e os cassetetes. E enquanto isso, o sorrisinho de víbora do Estripador.

Em Chaguitillo, durante toda a noite, os camponeses fizeram vigília para proteger suas crianças dos terroristas Contra de Reagan. Os camponeses nem mesmo eram sandinistas, aqueles "comunas" que o nosso presidente cabeça oca nos disse estarem a "apenas 48 horas de distância do Texas". De todo jeito, que diabo eles quereriam fazer no Texas?

Não obstante, os camponeses e suas famílias foram alvo do Reagan.

Na escuridão deserta de Chaguitillo, uma TV reluzia. Estranhamente, tratava-se de um filme de gangster de terceira categoria: "Irmão Rato" ("Brother Rat"). Estrelando Ronald Reagan.

Bem, meus amigos, vocês podem dormir um pouco mais tranquilos: o Rato está morto.

Assassino, covarde, vigarista. Ronald Reagan, adeus e que bom que nos livramos dele.

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